O traço fundamental e essencial da teoria marxista do conhecimento, ou antes daquilo que devia ser esta teoria, caso Marx tivesse desenvolvido e expresso a sua concepção acerca do conhecimento, esse traço é a natureza “construtiva” do conhecimento. Veja-se bem “representação”, e não reprodução, decalque ou outra forma da transposição de algo, da Realidade para o pensamento. O verum (e empregamos aqui o latim, que é o idioma oficial e padrão da Metafísica) seria algo que se situa na mesma linha do bonum, do unum, do aliquid, do res, como propriedade que deriva imediatamente do ente. Formulações igualmente ambíguas e reveladoras da concepção que vimos, isto é, a do Conhecimento como preexistente na Realidade exterior ao pensamento, e por ele aí apreendido (ou “refletido”, como se exprime a “teoria do reflexo”), se encontram esparsas pela generalidade dos textos do Dicionário de Rosenthal e Yudin referentes ao assunto. Não discutiríamos também as razões e explicação da persistência dessa deformada e tão prejudicial visão metafísica do fato do Conhecimento. Referindo-se às origens da Economia Política, como disciplina científica, Marx nos traz, nos chamados Manuscritos de 1857, uma breve súmula do que constitui, em suas próprias palavras, “o método científico correto” da elaboração do Conhecimento. Esse essencial consiste centralmente e numa palavra, na determinação de relações através da análise. do conjunto de que participam e que constituem. O papel que cada qual desses elementos desempenha é sempre função do dos demais. Operação essa última da qual resultam as mercadorias que uma vez vendidas recompõem em dinheiro o valor do capital originariamente invertido, mais um excedente que representa o lucro do capitalista titular do mesmo capital. Encontramo-nos aqui, como se vê, no coração da problemática do Conhecimento. Na Filosofia clássica, isto é, inspirada e fundamentada na Metafísica, trata-se na elaboração do Conhecimento de apreender a “essência” do objeto real. a unidade na diversidade” — o que é, segundo vimos, da natureza das relações. Doutro lado, contudo, na elaboração do Conhecimento, “as noções abstratas permitem reproduzir o concreto por via do pensamento”. No primeiro caso, que consideramos acima, colocamo-nos na perspectiva do Conhecimento já elaborado e incluído no pensamento, que é o conceito representativo de uma feição da Realidade (o concreto real), resultante do processo de síntese efetuado pela integração do relacionamento. No outro caso, estamos na perspectiva contrária, a saber, na do processo de síntese em operação e que vai dar na reprodução e representação mental do concreto real. No “concreto pensado”, na expressão de Marx. É justo, mas é uma simples tautologia — na medida em que a totalidade concreta, uma vez que a totalidade pensada ou representação intelectual do concreto, é o produto do pensamento e da representação. Mas ela não é absolutamente o produto do conceito que se engendraria ele próprio, que pensaria fora e acima da percepção: ela é o produto da elaboração dos conceitos a partir da percepção e da intuição. Considera-as na perspectiva umas das outras e do conjunto que constituem. Encontramos aqui mais uma circunstância, e das mais graves, da confusão que as concepções metafísicas com suas distinções e rígidas discriminações, introduzem na apreciação dos fatos do Conhecimento. Faremos adiante essa transposição para uma instância essencial da obra de Marx. Observe-se o desenrolar do pensamento na operação de equacionamento. Nesta preliminar teórica acerca do seu método de elaboração da Economia Política, isto é, da conceituação mentalmente representativa da estrutura e do funcionamento do capitalismo, Marx não conta em mais pormenores da maneira como realizar, e como de fato ele realizaria o relacionamento a que se propôs. Que incógnita é essa? O que central e fundamentalmente preocupa Marx ao abordar a análise do sistema econômico do capitalismo é sem dúvida a compreensão da maneira pela qual se realiza nesse sistema a exploração do trabalhador, isto é, o usufruto por alguns, dos resultados do trabalhador e esforço produtivo de outros. Será na premissa que se propõe nesse fato da exploração do trabalho humano que partem. Marx terá descoberto e reconhecido a mais-valia como forma específica de comportamento social, disfarçada e oculta no âmago das situações, feições e circunstâncias em geral da Realidade econômica do capitalismo. A saber, a circulação do valor de troca. A saber, a circulação do capital. O relacionamento das situações e momentos sucessivos do processo histórico do capitalismo em sua gênese, e com isto a reconstituição da seqüência e continuidade daquele processo, prepara e esclarece o relacionamento que irá dar na percepção do conjunto da organização econômica analisada por Marx. Realmente, o papel do capital e a maneira como se comporta — e com isto aquela percepção de conjunto da estrutura e funcionamento do sistema — se alcança sobretudo ao considerar o processo histórico através do qual a circulação do capital se amplia e por essa ampliação adquire nova e mais complexa feição. É nisto que essencialmente consiste a circulação do capital industrial, feição essencial e fundamental do capitalismo e centro nevrálgico do sistema. Assim sendo, “o valor da força de trabalho será o valor dos meios de subsistência necessários à manutenção do trabalhador” Temos aí a solução do problema central que Marx se propôs, e que o levou à conceituação do sistema capitalista. Isto é, à teoria econômica do capitalismo.
Fonte: http://pt.shvoong.com
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